Nossa
missão é
somar sempre

Retomada só em 2015

Portanto, recuperação – se e quando vier, é só para 2015.

Com indicadores cada vez mais desfavoráveis, como a lentidão na criação de empregos com carteira assinada, embora ainda não apareçam sinais de desemprego (leia na página 15 da presente edição), a economia brasileira avança pelo segundo semestre com apenas uma certeza: a confiança está baixa para o consumo e o investimento e sua volta só é possível após as eleições. Portanto, recuperação – se e quando vier, é só para 2015.

Esse cenário foi passado em revista, ontem, por dois renomados economistas, em São Paulo: Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC) e sócio-diretor da Tendências Consultoria e Octavio de Barros, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco.

Para um público de associados da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Loyola – eleito Economista do ano de 2014 pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB) – disse que a economia está anêmica e sem dinamismo, em parte por causa do cenário externo de crescimento baixo, mas principalmente por causa do ambiente doméstico.

"A média de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil de 2011 a 2014 foi de 1,7% ao ano. O percentual foi 47% menor do que o crescimento médio de países da América Latina. O dever de casa na política macroeconômica não foi bem feito", afirmou.

Para este ano, a projeção é de alta de 0,6% do PIB, percentual que sobe para 1,5% em 2015.

Barros, frente a uma platéia de empresários, reunidos no XII Encontro Nacional SCA Systema Consultores Associados, disse que o Brasil não vai tão mal, mas precisa correr para se adaptar à realidade do financiamento global após a retirada de estímulos monetários pelos Estados Unidos, prevista para o segundo semestre deste ano. "No próximo governo teremos um semestre de ajustes nos preços administrados e fiscal, além de reformas necessárias. O segundo semestre de 2015 será de recuperação da confiança", afirmou.

Nomeando-se “um realista esperançoso”, qualificação que tomou emprestada de Ariano Suassuna (1927-2014), reforçou que não gosta do rótulo de otimista. "O problema é que há uma politização excessiva do debate macroeconômico", disse. A projeção de Barros para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano é de crescimento de 1%, com viés de baixa. Para 2015, a projeção é de elevação de 1,5%.

Ambos os economistas falaram, depois de suas palestras, ao Diário do Comércio. Veja abaixo trechos das entrevistas.

"Baixo crescimento não surgiu do nada"

Diário do Comércio – Por que a projeção é de crescimento de 0,6% para o PIB 
neste ano?
Gustavo Loyola – Por causa da piora das expectativas dos empresários e consumidores, que tem a ver com o problema setorial da energia elétrica e o excesso de intervenção do governo em diversos setores. A aceleração da inflação deixou consumidores mais temerosos sobre seus salários reais, e com uma piora do mercado de trabalho. A percepção de que falta dinamismo gera um círculo vicioso, o que é ruim. Também tivemos fatores conjunturais, como a Copa do Mundo que atrapalhou a produção com muitos feriados, além da própria situação externa. É preciso lembrar que o baixo crescimento de 2014 não surgiu do nada e vem manifestando tendência de desaceleração desde 2011. Os fatores que levavam a economia para frente estão mais ou menos esgotados. O Brasil precisa reinventar o crescimento e isso passa por medidas que aumentem a produtividade e o investimento. Para isso é preciso um quadro macroeconômico estável, confiável e com reformas. 
 
DC – E isso só acontecerá após as eleições, em 2015?
GL – Sim. O processo eleitoral tirou do foco a política econômica e nenhuma medida estrutural será adotada porque depende do Congresso. Vai ficar para o ano que vem. O primeiro ano do próximo governo terá de ser aproveitado, porque normalmente é o período em que há uma base de apoio mais sólida. A oportunidade de 2015 não pode deixar de ser aproveitada. 
 
DC – O que falta aos candidatos, nesse sentido?
GL – O debate econômico está claro nessa eleição e todos os candidatos procuram falar de economia. Os de oposição evidentemente criticam a presidente, que se defende. A oposição diz que tem uma postura diferente da atual gestão. O importante é a sinalização de todos eles, e da própria presidente, sobre o que pretendem fazer em 2015 para tirar o Brasil dessa situação. Não adianta achar que está tudo bem e que não estamos crescendo só por causa da crise externa. No caso da presidente, será necessário que mostre  comprometimento com o avanço de reformas. De certa forma, fazendo um paralelo não perfeito, espera-se dela uma "carta aos brasileiros", como teve o papel da carta aos brasileiros do ex-presidente Lula, em 2002, mostrando os compromissos. 
 
DC – A economia está anêmica, mas qual a gravidade? E o que o senhor acha dos que dizem que estamos entrando em uma estagflação?
GL – O Brasil não está em crise, mas com uma economia estagnada, com baixo crescimento, e uma inflação alta. Então, desse ponto de vista, podemos dizer que pode ser o início de um processo de estagflação, que em sua definição clássica combina esses dois indicadores ao alto desemprego. Felizmente o mercado de trabalho não foi atingido, mas não há garantias de que as empresas podem ter queda no lucro e, para se defender, precisem cortar custos e reduzir o quadro de funcionários.
 
 
"Belle Époque do crédito não volta"
 
Diário do Comércio – As medidas para estimular o crédito tomadas pelo Banco Central terão efeito? 
Octavio de Barros – Sim. No médio prazo são positivas. Mas dependem da recuperação da confiança e do apetite do consumidor. Não temos problema de oferta de crédito pois os bancos estão fazendo o dever de casa e vão cooperar para aumentá-la. Mas há um problema de demanda. 
 
DC – Por que há tal problema?
OB – Não há relação com a inadimplência, que está em um patamar muito baixo. É um problema localizado: o orçamento apertado das famílias. Os serviços passaram de 40% para 60% no consumo total das famílias em um período de sete anos. Então, aquela "irresponsabilidade" dos consumidores com o crédito ocorreu até meados de 2011. De lá para cá, observamos uma mudança comportamental das famílias, que estão mais cautelosas e disciplinadas. Passamos por um período de aprendizado e a alta da inadimplência foi o custo social de uma inclusão bancária espetacular. 
 
DC – O senhor disse  que o período de 2004 a 2011 foi uma Belle Époque, que não volta mais. Explique.
OB – Foi a Belle Époque de inclusão social e bancarização acelerada. Foi datado historicamente e não podemos olhar para frente e reproduzir o que aconteceu. No período 2004/2011 o PIB cresceu à taxa média de 4,1% ao ano. De 1994 a 2013 o crescimento médio anual foi de 3,1%. Consumo e crédito cresciam acima do PIB. As empresas acharam que isso se repetiria ininterruptamente e agora refazem as contas. Agora o crédito e o consumo vão crescer mais em linha com o PIB. 
 
DC – Quais são os riscos de uma estagflação no Brasil?
OB – Muitos falam nisso por causa do PIB baixo e da inflação alta. Mas precisam olhar nos livros, porque há o componente do alto desemprego. Mesmo com a mão de obra caindo no Brasil, o desemprego é baixo. Esse índice vai piorar um pouco, em 0,5 ponto percentual no nosso cenário. Isso porque a população ocupada está desacelerando. A oferta de mão de obra caiu porque a população cresce pouco, os jovens permanecem na escola e os aposentados não voltam ao mercado, graças ao aumento de renda e de demais benefícios.
 
DC – Qual a sua projeção para inflação?
OB – A inflação está dentro da média histórica e vai fechar o ano em 6,3%. Passamos por uma transição natural, na qual a  inflação vai convergir para o centro da meta. Acredito que isso possa ocorrer entre 2017 e 2018, dada a rigidez da inflação de serviços no Brasil. O crescimento vai voltar gradualmente e chegar ao patamar de 3% daqui a um par de anos. Mas isso depende da volta da confiança, da agenda de reformas e da plataforma que será construída para o futuro. Qualquer que seja o novo governo, terá de fazer correções, ajustes adaptativos e preparar a economia para a retirada de estímulos nos Estados Unidos. Muitos falam que o juro norte-americano subirá antes, mas eu acho que será em junho de 2015.